terça-feira, 1 de novembro de 2011

MS concentra mais da metade das mortes de indígenas em conflitos pela terra, aponta pesquisa

Na tarde desta segunda-feira (31), o Conselho Indigenista Missionário (CIMI) lançou o livro “As violências contra os povos indígenas em Mato Grosso do Sul; e as resistências do Bem Viver por uma Terra Sem Males”.

O material traz um verdadeiro relatório das lutas e dos principais conflitos envolvendo os índios nos últimos oito anos, em todo o Brasil. Entre os inúmeros dados que compõem o material, os assassinatos chamam a atenção. No período pesquisado, 452 indígenas foram mortos no Brasil, só em Mato Grosso do Sul, foram 250. Isso sem somar ainda as tentativas de homicídios: 350 no país; e 190 casos aqui no Estado.

“São estatísticas comparadas aos países em guerra. Mostramos nessa coletânea o que acontece na realidade; o pouco que está sendo feito pelos nossos representantes e o que é necessário para reverter essa situação, no país”, disse o coordenador regional do CIMI/ MS, Egon Heck.

O evento foi realizado na Cúria Metropolitana, espécie de sala de reuniões da Igreja Perpétuo Socorro, em Campo Grande. Para Heck, existe uma série de fatores que originaram nos casos de violência, mas ele afirmou que ‘a situação se complicou mais ainda devido à lentidão nas demarcações de terras em todo o Brasil, principalmente em nosso Estado.

“Já se vão 40 anos que trabalho no CIMI, em outras regiões também, e conheço as dificuldades das diferentes etnias do Brasil inteiro. Mas em Mato Grosso do Sul, a situação dos Caioás Guaranis é, sem dúvida, a mais grave. São os piores índices do mundo, em relação à violência e à defesa dos Direitos Constitucionais dos índios”.

Representando a comunidade Curuçuambá, de Coronel Sapucai, na divisa de Mato Grosso do Sul, Eliseu Lopes lembrou as tristes estatísticas, onde mais de 60 lideranças indígenas daquela região já foram mortas durante combates pela terra. “Mato Grosso do Sul é campeão em violência contra nosso povo. Queremos segurança e o cumprimento dos nossos direitos.”, declarou.



Conflitos anunciados e outros números da pesquisa

Nos primeiros nove meses deste ano, o livro mostra que dos 38 registrados registrados no país, 27 ocorreram em Mato Grosso do Sul, o que significa 71% do total.

“Os Guarani Caioás estão se organizando. Se o Governo Federal não agilizar o processo, não demarcar as terras, nós vamos fazer com as próprias mãos. Muito sangue ainda será derramado porque ninguém está resolvendo o nosso problema”, falou Eliseu.

O livro traz, numa escala de denúncias e sugestões, três linhas de pensamento: 1) a questão da violência; 2) aprofunda o debate com textos de especialistas da área do direito, procuradores da República e do Trabalho; e 3) que traz a esperança, uma realidade do que poderia acontecer no Estado.

Um desses agravantes já começa pelo espaço físico destinado aos povos indígenas. Em Mato Grosso do Sul, são mais de 70 mil índios (principalmente os Caioás Guaranis e Terenos), mas, segundo o estudo, as terras indígenas não chegam a 0,2% no Brasil.

O relatório mostra ainda que até 2009, eram 22 acampamentos de indígenas; hoje, são 31. O número revela que são mais de 1200 famílias vivendo em condições subumanas, à beira de rodovias ou em fazendas.



Razões históricas

“O problema da demarcação de terras é muito antigo. Somados ainda outras questões, como: preconceitos, atitudes racistas, entre outros, que acabaram confinando os índios. Isso faz com ele (o índio) fique mais revoltado, mais agitado, e acaba ajudando para que os problemas internos se agravassem”, reforçou o coordenador do Conselho Indigenista Missionário.

No livro, são discutidas ainda a desnutrição infantil, que atinge hoje mais de 4 mil crianças indígenas no Estado; o alto número de mortalidade nessa faixa etária (93 para cada 100 mil). O trabalho pesado nos canaviais e o grande número de suicídios entre os indígenas: no Brasil, 206 e em Mato Grosso do Sul, 176 registros durante os oito anos de pesquisa.

‘São falhas históricas, tanto do governo Federal quanto do Estadual, que destinaram terras pra que não deveria, ou para expansão agropecuária; ou ainda para grandes grupos empresariais, especialmente as companhias de álcool’ foi a tônica do discurso.



Poucas ações eficazes

Muito emocionado, ao falar dos desrespeitos aos indígenas, Lindomar Ferreira, também critica que falta uma política urgente para solucionar a demarcação de terras em Mato Grosso do Sul. “Enquanto pensarem e agirem com ganância, passando por cima dos nossos direitos, muito sangue será derramado”.

O representante da Aldeia Cachoeirinha, em Miranda, hoje tem 36 anos de idade e denuncia que ´são raríssimos´ os acusados de matarem índios ficarem atrás das grades. “Convido o Estado a fazer essa reflexão. Que ‘desenvolvimento é esse? Cadê a democracia? Vivemos uma guerra e o nosso povo, que é trabalhador e honesto, está morrendo”, desabafou.

Eliseu já presenciou 5 mortes em sua aldeia. A ex-líder do grupo, inclusive, foi assassinada na frente de todos para intimidar os demais integrantes da Aldeia. “Já fui ameaçado e perseguido também. Atualmente, estou longe da minha família por tudo isso que vem acontecendo, mas não vamos desistir, vamos continuar lutando”.



Políticas públicas

“Esse material serve para subsidiar os Governo Federal e Estadual e também informar a sociedade, de uma forma geral, sobre o atual quadro em Mato Grosso do Sul”. Esse é o resumo do advogado do CIMI, Rogério Batalha.

De acordo com Batalha, ‘o Estado Brasileiro tem atraso histórico com relação à demarcação de terras indígenas’. “Falta vontade política para dar uma solução eficaz. Temos que buscar todos os caminhos, inclusive o jurídico”.

O advogado critica também diretamente as autoridades quando o assunto é ‘políticas públicas voltadas aos indígenas’. “Por aqui e principalmente no exterior, vemos a propaganda de um ‘Brasil em desenvolvimento’, mas o Governo não consegue resolver um problema interno. Destina bilhões de reais para projetos e empresas, mas nada é feito nessa questão indígena".


A posição do arcebispo da capital

Dom Dimas Lara Resende, arcebispo da capital disse que é grande a vontade de dialogar dos povos indígenas. “Mas precisamos caminhar muito ainda e a informação para a nossa sociedade é importante. Lembrou que ainda há muito preconceito as diferentes etnias dos índios. “A pessoa vale pelo que é, à imagem e semelhança de Deus. Queremos que respeitem todas as diferenças”.

O arcebispo citou igualmente aos demais, o atraso na solução do problema. “Há décadas, o Governo Estadual vendeu títulos que eram de propriedades indígenas para produtores e os conflitos só estão se agravando”, disse Dom Dimas.

O material (o Livro) será enviado às entidades governamentais; às ONGs e também servirá para subsidiar trabalhos acadêmicos no Estado.



Fonte:
http://midiamax.com.br/noticias/774422ms+concentra+mais+metade+mortes+indigenas+conflitos+pela+terra+aponta+pesquisa.html

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