O tema da presença de advogados descendentes de indígenas no mercado da advocacia americana pegou de surpresa os participantes do encontro anual da American Bar Association, a OAB americana, ocorrido nas últimas duas semanas em Toronto, no Canadá. Segundo eles, há algo errado com as estatísticas, já que os números simplesmente não batem.
De acordo com a ABA, entre as décadas de 1990 e 2000, cerca de 2,6 mil indígenas ou descendentes de indígenas norte-americanos se graduaram em faculdades de Direito credenciadas pela Ordem dos Advogados do país. Contudo, de acordo com o último censo nacional, o número de advogados desse perfil étnico em atividade aumentou apenas em 200 profissionais.
A conclusão natural, de que o mercado da advocacia americana é hostil à diversidade étnica, foi rejeitada pela própria National Native American Bar Association Center for Racial and Ethnic Diversity (Centro para a Diversidade Racial e Étnica da Ordem Nacional dos Advogados Indígenas Americanos). A discrepância, segundo o Centro, seria em razão de muitos candidatos a vagas nas faculdades mentirem que são ou descendem de indígenas.
A Câmara de Delegados da ABA quer agora que as universidades exijam provas documentais de pré-universitários que se declararem indígenas. Ou seja, o candidato a uma vaga na faculdade de Direito que se identificar como "nativo americano" terá que informar a filiação tribal e o número de inscrição da tribo junto ao Departamento de Estado, ou na falta destes, fornecer uma “declaração de herança étnica”.
Fraude acadêmica
Segundo a resolução assinada em conjunto pelos delegados das ordens estaduais e representantes da National Native American Bar Association, declarações falsas sobre a etnia correspondem a “um enorme e persistente problema que equivale ao pior da fraude acadêmica”. Por isso, normas a esse respeito tem de ser estabelecidas.
O documento diz ainda que há vantagens evidentes, em termos de competição, proporcionadas por fraudes do tipo. Nos EUA, para ingressar nas universidades, é levado em consideração todo o histórico de desempenho escolar do aluno, o perfil cultural, habilidades que possui, interesses e atividades extracurriculares as quais se dedicou. O fato de transitar entre duas culturas ou pertencer a um grupo étnico minoritário pode colaborar sensivelmente para uma boa avaliação do candidato.
Contudo, de acordo com a National Native American Bar Association, reconhecer-se como “Native American” não corresponde apenas a um perfil étnico, mas sim a ter uma cidadania, de fato, distinta. É pertencer, portanto, a uma tribo ou nação indígena com número de matrícula e registro.
Nos Estados Unidos, as populações e territórios indígenas dispõem de status legal singular, com direito a constituir governos, estabelecer leis e cobrar impostos. O relacionamento com esses grupos bem como questões de limitações à sua soberania são tratados pelo Departamento de Estado dos EUA, o Ministério das Relações Exteriores do país.
O tema é controverso mesmo para os próprios indigenas norte-americanos e seus descendentes. Para alguns grupos, 1/8 de descendência, ou seja, ter um dos bisavós originários de alguma tribo, basta para ser reconhecido como “Native American”. Porém, para o senso comum da maioria dos americanos, 1/16 de descendência – o que corresponde a um dos tataravós -, é válido para que alguém se identifique como pertencendo a um grupo étnico indígena natural da América do Norte.
Fonte:
Rafael Baliardo é correspondente da revista Consultor Jurídico nos Estados Unidos.
Revista Consultor Jurídico, 14 de agosto de 2011
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